Mobilização social e redes sociais

20/06/2013 20:24

Nos últimos dias, no Brasil, um conjunto de mobilizações articuladas por jovens, em sua maioria, utilizando-se das redes sociais paralisou as principais avenidas   de algumas capitais e cidades de maior porte. Estimulados pelo Movimento Passe Livre e também por outros organismos sociais, a mobilização social que se presenciou foi marcada por reações diversas tanto sob a perspectiva governamental quanto da sociedade. Sob a ótica do Estado, pudemos presenciar a força nova que a articulação de reuniões e causas através da internet trouxe à pauta política. Sendo um meio de comunicação ainda sem a censura intensa que a TV e o rádio sofrem em alguns casos, a internet permite divulgar fotos e acontecimentos com maior amplitude e rapidez. Aliás, essa é uma característica que Eugênio Trivinho bem descreve como típica de nossos tempos, a velocidade com que tudo pode ser "construído" e compartilhado por meio das novas tecnologias. Esse fenômeno recebeu o nome de DROMOCRACIA (ver artigo anterior sobre isso neste site). E essa mesma velocidade e capacidade de articulação em poucos "cliques" chocou muitas autoridades ainda acostumadas com o ritmo mais lento das mobilizações sociais de tempos atrás. 

Outra característica típica de nosso tempo atual é o pluralismo de lideranças, de causas, de pessoas, todas juntas durante a manifestação embora nem sempre defendendo um interesse particular. As mobilizações recentes mostraram que a fragmentação das passeatas (estudantes, professores, passageiros de ônibus, etc.) foi reduzida pelo movimento conjunto. A partir da pauta comum de "direitos fundamentais", finalmente os brasileiros compreenderam que lutar de modo unido e mais eficaz dom que cada qual defender apenas o "seu quinhão". Se o país é de todos, cada grupo de intertesse próprio deve apoiar os demais. Não é preciso usar o transporte coletivo para defender a sua qualidade, ou consumir carne para querer que os alimentos sejam mais acessíveis, por exemplo. PENSAR NO OUTRO, RECONHECÊ-LO COMO SUJEITO, a exemplo do que defende o jusfilósofo Jürgen Habermas, foi outro grande ganho dessas manifestações, não obstante o papel triste que alguns vândalos desempenharam nas ruas, contrariando a democracia, afinal, se a população temer o movimento ao invés de se identificar com ele, pouco a pouco a mobilização tenderia a perder a sua força. É preciso, realmente, estabelecer uma democracia deliberativa no Brasil, o que significa que os cidadão está acima das bandeiras partidárias (como visto em São Paulo, estado em que o governador, de um partido, e o prefeito da capital, pertencente a outro, apresentaram-se juntos perante a imprensa para se comprometerem com uma agenda comum que atendesse, ainda que parcialmente, aos manifestantes).

A virtualização dos movimentos sociais é um fato inegável, o uso de mídias sociais e novas tecnologias foi uma das ferramentas mais importantes para que a sociedade pudesse ocupar novos espaços públicos de debate e INTERATIVIDADE.  O Estado precisa, então, estar presente e participar dessa nova geração de cidadãos brasileiros que pensa, age e se organiza diferentemente de seus pais. Em minha tese de doutorado pela PUC Minas defendi a aplicação do PRINCÍPIO DA RESILIÊNCIA estatal (ver artigo anterior neste site), ou seja, assim como os corpos físicos que sofrem impactos externos e mantêm sua essencialidade, é hora, agora, de debatermos sobre a ESSENCIALIDADE do tipo de ordenamento jurídico e político posto, defender esse núcleo fundamental, e permitirmos à abertura à novos sujeitos de direito. O Estado resiliente, como tentei descrever em minha tese, é o poder político sustentado por uma base constitucional válida formal e materialmente, e que oferece, em suas relações com a sua população, instrumentos suficientes de efetivação de uma democracia deliberativa. Ele defende as instituições necessárias à vida comum com qualidade humana e social, ao memso tempo em que persevera em um movimento contínuo de sua atualização e "checagem" por meio de um processo de "accountability" vertical produtivo, ou seja, o povo é empoderado para poder verdadeiramente exercer sua cidadania junto aos órgãos públicos. Segundo Jacques Derrida, é um processo contínuo de desconstrução e reconstrução do direito e da política para que o valor da justiça se sobreponha. Não é um mundo perfeito, mas uma versão mais participativa do mundo imperfeito que temos, afinal, se muitos podem deliberar, maior a chance de acertamos.

Tal realidade traz desafios. Como garantir a legitimidade do que se faz por meio das redes sociais uma vez que muitos "perfis" são o que se chama de "fake" (falsos)? Qual a confiabilidade das informações divulgadas? Para que muitos tenham o direito de dizer o direito, é preciso que aquele que deseja se manifestar usando de sua liberdade de expressão, como a própria Constituição brasileira de 1988 o menciona, não fiquem no anonimato. É preciso, aidna, que se possa garantir que os dados divulgados sejam reais, para não induzir ninguém a uma mobilização sem conhecer o seu intuito (ou induzir a participar de qualquer forma de atuação por meio digital, estatal ou não, de modo enganoso). Será necessário, ainda, como alerta Trivinho, criar senhas de acesso, ou infotécnicas, para que a exclusão digital não desempodere muitos brasileiros de sua condição emancipada de cidadãos, tais como: acesso à internet, a computadores adequados (hardware), a aplicativos (software), compreensão da linguagem usada nesse novo meio virtual, entre outras. Para participar da democracia deliberativa em meio digital será necessário estimular e capacitar os brasileiros quanto à DROMOAPTIDÃO, habilidades necessárias para um  mundo mais rápido, complexo e plural.

Tanto os movimentos sociais quanto o Estado precisam se preocupar com os menos "aptos" digitalmente para não começarmos uma "revolução dos mais conectados". TODOS os brasileiros precisam ser trazidos para a agenda social dessa nova era para o Brasil que as recentes mobilizações buscam defender. Sem exceção. O que faremos, então, para que o acesso digital se amplie e também para que o "presencial" não se distancie demais? Aproveitemos essa fase de mudanças para (re)pensarmos a nós mesmos e ao Brasil. Afinal, será que estamos todos preparados para uma ampla aceitação social do OUTRO? A sociedade civil também precisará ser mais resiliente - menos "resistente" ao diferente - se quisermos um novo Brasil. Cada grupo de interesse precisará avaliar o que consuiste na sua essencialidade e qual a parte de flexão que precisará fazer, sem isso, todo discurso de "direitos", "inclusão" e "democracia" será falacioso.

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