Educar "direito" para formar cidadãos

21/06/2010 19:39

“As liberdades de ação individuais do sujeito privado e a autonomia pública no cidadão ligado ao Estado possibilitam-se reciprocamente. É a serviço dessa convicção que se põe a idéia de que as pessoas do direito só podem ser autônomas na medida em que lhes seja permitido, no exercício de seus direitos civis, compreender-se como autores dos direitos aos quais devem prestar obediência...” (HABERMAS, Jürgen. A inclusão do outro: estudos de teoria política. São Paulo: Edições Loyola, 2ed., 2004. p. 298).

 

Refletindo-se sobre a que expõe Habermas, depreende-se que o Direito não só é imprescindível para assegurar prerrogativas humanas fundamentais, quanto também para permitir que esses mesmos seres humanos, que às normas se submetem, possam ser SUJEITOS. Essa proatividade não se resume no direito se ajuizar ações que defendam sua propriedade, seu nome ou suas relações com outros indivíduos. Inclui o "direito de dizer o que é o Direito". De participar do processo legislativo que cria as normas jurídicas, de criticar e contribuir para o texto final destas e para definir as prioridades legislativas quanto às demandas sociais. Robert Michels, em seu livro "Sociologia dos Partidos Políticos" (Brasília, UnB, 1982, p. 21ss) chama nossa atenção para o perigo de se delegar aos representantes eleitos, que fazem as normas, um poder, pelo voto, maior do que aquele que realmente se quis conceder. Se a nossa voz "ficou na urna" por quatro anos (oito, no caso dos senadores), essa representação perdeu grandemente sua qualidade democrática. Diante disso, a educação jurídica é necessária para modificar a cultura existente à medida que forma bacharéis aptos a atuarem como críticos desse modelo e profissionais dispostos a contribuir para sua modificação. A situação da subcidadania é marca notória da América Latina, em razão da pobreza econômica, das desigualdades sociais e dos longos anos de ditadura em vários países. Para o fortalecimento do Estado Democrático de Direito, mister se faz a inclusão de todos os "outros" sujeitos que ainda não compõem a mesa de debates no Brasil. É preciso também reinterpretar o Direito a partir de uma ótica que não seja apenas da literalidade legislativa, mas que inclua todas as ricas contribuições que ao longo do século XX a teoria do direito e as teorias sobre a justiça forneceram para esse diálogo. Sem renunciar à sistematização e racionalidade adquiridas pelo direito positivo na Modernidade, essenciais para a organização do modelo imparcial de julgamentos, por exemplo, há de se perquirir um pouco mais profundamente a respeito do fundamento moral de um direito excludente e pautado na "infância" do povo, assim visto como incapaz de se articular de modo emancipado. Essa noção de povo tutelado e não SUJEITO é um dos maiores desafios da intelectualidade jurídica, e não somente do governo. Infelizmente, muitos juristas ainda acreditam na "aristocracia dos bacharéis" e é preciso saber diferenciar a má formação escolar dos brasileiros em relação à uma falta de percepção da realidade, que na verdade, costuma afetar alguns representantes eleitos do povo. É preciso educar os cidadãos, sim, mas lembrando que nesta categoria estamos todos nós.

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