O bom curso exige bom profissional... desde o início

12/07/2012 13:53

 

Há tempos não posto um artigo. Peço desculpas. Estava terminando meu doutorado e logo em seguida tive as pendências de praxe que nossa vida tem quando a paramos por uns tempos para terminar um projeto. Mas neste período de "pausa", talvez bem necessária, pude observar melhor algumas reflexões que postarei aqui sobre a relação ensino-aprendizagem em sala de aula nos cursos superiores de Direito. E elas externam minhas preocupações, hoje, com qualidade dessa educação. 

A primeira delas é a questão ética. Não parece mais incomodar a muitos alunos. Antigamente, agir de modo incorreto era para poucos; depois passou a ser uma prática menos rara, porém escondida, porque havia "vergonha". Presencio hoje em sala de aula, muitas vezes, a perda da ética de modo mais sério, porque a "vergonha" já não está mais lá para servir de alerta. Os alunos que "colam" em provas, por exemplo, já não tentam negar que estavam "colando", argumentando, na verdade, de que o professor é que não deveria "dar tanta atenção" a essas coisas. O lema "quem cola não sai da escola" é dito com leviandade e risos. Tive dois casos, infelizmente, de alunos que "colaram" informações equivocadas de seus colegas e vieram solicitar "segunda chance". Queriam a oportunidade de refazer a prova porque "não sabiam que o colega estava tão ruim na matéria". Há alguns anos, um aluno me perguntou por que não o avisei que o colega estava indo mal na prova antes que ele a entregasse (!). 

A segunda são os problemas contínuos provocados pela "rádio do corredor", que alimenta os alunos constantemente com informações falsas, contraditórias, e cuja única intenção é forçar alteração de datas e conteúdos sob a justificativa de que os alunos "não sabiam direito" como seria; ficaram na dúvida por causa dos comentários dos colegas e, por isso, deveriam ter o direito de adiar provas e trabalhos, ou de reduzir o conteúdo abordado nas avaliações. Isso, após terem disponível no sistema da faculdade o plano de ensino com roteiro de aulas e avaliações e, ainda, de em nenhum momento terem ouvido qualquer modificação vinda do professor. Em meu caso, não altero datas ou conteúdos, deixo claro aos discentes que preferir ouvir o colega no corredor é uma opção - e grande risco - que ele próprio assumiu. O ensino superior exige responsabilidade, acredito que quem não consegue organizar minimamente sua agenda de estudos, por exemplo, não deve receber de mim nenhuma indicação para estágio no futuro, pois não gostaria de indicar a um colega de profissão um colaborador (?) que não fosse capaz de dar conta de suas próprias atividades, quanto mais das que envolvem um escritório. Sem contar, que jamais indicaria alguém que corrompesse "notícias" ou "determinações de tarefas" para se eximir de culpa. Esta atitude é imatura e antiética.

Sim, preocupa-me esta geração cheia de “direitos” que não assume adequadamente seus “deveres”. Considero muito corretas e apropriadas suas lutas para melhorar a educação, como as recentes manifestações organizadas pela UNE em todo o país. Acredito que nem todos sejam iguais e é por saber que a maioria deseja qualidade que defendo a severidade com os antiéticos, com os menos responsáveis, com aqueles que no futuro podem vir a apontar o nome do professor como razão de sua não aprendizagem, mas que dificilmente irão ASSUMIR A RESPONSABILIDADE pelas faltas à aula, pelas poucas horas de estudo, pela desatenção em sala por divertirem-se com Ipads, Iphones (quantos alunos já vi “exercitando” joguinhos de celular em sala ou no Facebook...).

Há uma parcela da discência que não estuda e precisa culpar alguém por isso, principalmente quando os pais é que pagam as mensalidades e exigem bons resultados. Bem, dependendo da IES, é possível “vencer” o professor e demiti-lo, acusar o MEC, culpar a direção da instituição, os “maus” colegas que o atrapalharam e assim sucessivamente em uma cascata quase infinita de justificativas para a falta de compromisso sério com a própria educação. Não estamos falando de crianças, mas de jovens que querem ter carro, liberdade, autonomia e outros direitos sob a defesa de que são adultos; ora, nada mais natural que deles se exija responsabilidade com a própria vida acadêmica.

Talvez o mais grave de todo o desgaste provocado por tudo isso seja o desvio de atenção para questões menores – cada um deve assumir seu próprio rumo – enquanto se poderia debater, de verdade, as questões centrais de qualidade na educação superior: infraestrutura, pesquisa, projetos de extensão, publicações, congressos, mudança da sociedade, empregabilidade após a formatura, didática dos professores, rigor das provas (professor “bonzinho” elimina concorrência, porque permite a você formar sem saber, enquanto “ele sabe”; nada melhor para eliminar concorrência do que convencer o futuro concorrente de que é “bobagem ler aprofundar mais”). Admiro muito os DAs que, ao invés de organizarem manifestações pelo direito de beber bebida alcoólica dentro das faculdades, lutam, sim, por mais bolsas de pesquisa, melhoria dos professores, exigência do curso e garantia futura de que serão mesmo profissionais capacitados.

Esta é minha terceira preocupação: festa demais, estudo de menos. Quem disse que na Faculdade não se pode divertir? Pode, sim. Após o dever cumprido, afinal, Universidade não é shopping center. AQUI SÃO PREPARADOS ADULTOS QUE DEVERÃO SE COMPORTAR COMO PROFISSIONAIS. É natural relaxar nas horas vagas, reunir-se com os amigos, festejar a formatura. O que fica estranho é o caso como o de uma aluna minha de um ano atrás: perdeu o semestre porque resolveu colocar silicone nos seios três meses antes da formatura para ficar bonita nas fotos e no vestido que encomendara. Resultado: como o MEC não autoriza abono de falta por motivo estético e a estudante não estudou o suficiente, foi ao baile, mas não à colação de grau, já que ela não estudou para ser aprovada no seu último período de curso.

Pode ser que a alguns incomodem essas palavras. Tudo bem. Mas quem sabe através delas possam compreender porque alguns professores não aceitam orientar monografia de alguns alunos já “conhecidos pela malandragem”, não assinam o pedido de carteira de estagiário junto à OAB destes mesmos estudantes, ou porque não os indicam para estágio junto a um de seus contatos pessoais. Quem arriscaria a própria reputação por um aluno que só passa com “cola”? Que “cria conflitos” entre docentes e discentes para tentar forçar mudança de datas e conteúdos? Que sempre culpa outras pessoas pelo que deixou de fazer? Como disse, na faculdade/universidade se formam profissionais que possamos indicar sem medo. Você pode festejar, mas se a vida for só festa, como conta a fábula de Lafontaine: para o trabalho se indicam formigas, não cigarras.

 

 

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