Resiliência aplicada ao Estado e ao Direito

05/02/2012 20:39

O atual contexto jurídico brasileiro exige um princípio de suma importância que deve ser aplicado para reger as relações entre Estado e sociedade civil visando à concretização dos direitos fundamentais em um contexto de democracia deliberativa. E este princípio, de modo inédito no direito, foi proposto por mim como o PRINCÍPIO DA RESILIÊNCIA APLICADO ÀS RELAÇÕES ENTRE ESTADO, DIREITO E SOCIEDADE CIVIL, o qual defendo no dia 12 de março de 2012 em minha tese de doutorado na PUC Minas (Luciana Cristina de Souza – Doutorado em Teoria do Direito – Orientadora: Prof.ª Rita de Cássia Fazzi). O tratamento dado à resiliência deve ser principiológico, em virtude de ser primordial servir como referência geral sobre um novo modo de se construir socialmente o direito, mais amplo do que o paradigma liberal dos séculos XVIII e XIX, gerando, via de conseqüência, um conceito mais amplo do que seja o direito

 

Conceito advindo da Física, a resiliência é a qualidade que certos materiais possuem de sofrerem forte tensão e, ainda assim, manterem suas características fundamentais. Significa mudar sem destruir o cerne do ser; é adaptar-se às contingências sem que neste processo o objeto, em sua natureza essencial, descaracterize-se. Na Psicologia, primeiro ramo a importar o conceito, representa o poder de superar situações críticas e delas sair fortalecido, (re)construindo-se. A importação deste conceito pela Sociologia Jurídica, cujo método de análise difere da dogmática quanto à forma de observação dos fenômenos jurídicos, serve para descrever de que maneira as sociedades atuais conseguiram, às vezes até mesmo de forma inusitada, manter características essenciais do Estado moderno como constitucionalidade, monopólio da violência física pelo Poder Público, burocratização (em seu sentido não pejorativo), estabilidade, entre outras, e, simultaneamente, transformá-lo.

 

Embora o esqueleto se sustente, o restante desse corpo jurídico assume hodiernamente uma nova plasticidade. É preciso, então, explicá-la, tentar compreender como ela se desenvolve, que formas novas pode assumir (se já não o fez em alguns casos) e, ainda, como pode interferir no modo como a relação entre Estado, direito e sociedade se constroi no cotidiano brasileiro dos tempos atuais.

 

A necessidade do estudo da resiliência decorre de uma característica própria de nossos tempos que não pode ser negada, a reorganização da ação coletiva no Brasil visando a inclusão social e, porque não dizer, jurídica de muitos brasileiros ainda alijados da real cidadania assegurada pela Constituição de 1988. Isso porque, é de fundamental importância que a luta por inclusão e por reformulação dos instrumentos de acesso não seja confundida com o desrespeito ao semelhante ou às instituições. O discurso de que a apresentação de contrapontos ao modelo estatal-legal vigente por parte da sociedade seriam manifestações contrárias à ordem e à segurança combinam com o regime ditatorial que assolou este país por trinta anos, não com a democracia, que traz para si, sim, o árduo desafio de ouvir as múltiplas vozes que neste país querem ser escutadas.

 

Tanto que, neste estudo, questiona-se a ideia vencida de que o povo seria uma categoria inapta a elaborar políticas públicas ou a debater medidas jurídicas, devendo-se deixar tal tarefa apenas aos técnicos. Nesse trabalho, portanto, será primordial considerar-se a relação entre Estado, direito e sociedade sob a ótica da ação social, pois tanto os indivíduos se tornaram sujeitos mais ativos na luta por suas prerrogativas fundamentais, como foram inovadas e ampliadas as modalidades de participação dos grupos sociais perante o Poder Público na defesa de seus interesses. A cidadania não pode mais ser apenas um discurso e o cidadão a representação desta ideia, nunca concretizada.

 

Para tanto, a análise dessa relação trinomial – Estado, direito, sociedade – deve considerar o modelo democrático vigente, no âmbito do qual as formas de ação social são executadas e sofrem, igualmente, limitações devido às regras jurídicas existentes. Em razão disso, o conceito de democracia deliberativa adotado é o de regime jurídico-político pautado na organização da participação popular visando a sua inserção na tomada de decisões políticas e no processo de elaboração das normas jurídicas que serão aplicadas.

 

Sabe-se que muito mais há a discutir, especialmente porque a questão da resiliência ainda é nova e os mecanismos político-jurídicos ainda estão se adaptando a essa nova modalidade de participação popular na elaboração do direito e, por que não, de políticas públicas. O Estado ainda enfrenta desafios institucionais de funcionamento e de abertura aos cidadãos que precisam ser superados. Logo, a resiliência se torna, hoje, um princípio tão fundamental quanto o do federalismo, visto que assim como é preciso garantir o equilíbrio entre os entes federados, também é de suma relevância assegurar o equilíbrio, por meio do direito, entre Estado e sociedade civil, não apenas concedendo direitos negativos, mas, ainda, direitos de proatividade junto à dinâmica da vida comum controlada pelos órgãos estatais.

 

Isso, ainda que em desenvolvimento no Brasil, já se vê nos conselhos gestores, como os de saúde e de educação, na gestão ambiental participativa quanto às unidades de conservação, e em outras iniciativas tanto do Poder Público quanto dos cidadãos que foram sendo paulatinamente implementadas no cenário após a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Com este estudo não se pretende desconstituir o Estado de Direito e, tampouco, o direito positivo. Contempla-se, sim, a viabilidade – esta é a palavra mais adequada – de que a estrutura estatal sofra mais uma mutação para assegurar o ideal democrático e a cidadania defendidos pela Constituição Da República Federativa do Brasil de 1988.

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