Giordano Bruno Soares Roberto

Giordano Bruno Soares Roberto

Comunicação apresentada na Faculdade de Direito da UFMG, no dia 30 de agosto de 2010, durante a Semana Acadêmica, organizada pelo Centro Acadêmico Afonso Pena.

Pediram-me para falar sobre ensino e pesquisa. No entanto, ninguém teve o cuidado de me explicar exatamente os tópicos que eu deveria abordar ou o modo como deveria proceder. E eu não seria tonto de perguntar, porque assim é bem melhor. Sinto-me à vontade para falar o que quiser, do jeito que quiser, desde que, uma vez ou outra, mencione as palavras ensino e pesquisa.

E, assim, não vou começar definindo ensino e, depois, pesquisa, para, em seguida, explicar como ambos se relacionam. Também não vou começar citando a Constituição da República ou a Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Proponho, ao contrário, iniciar com uma breve reflexão sobre o papel da educação jurídica em nossos dias e só um pouco mais adiante mencionar os dois assuntos indicados.

Então, mãos à obra!

É possível pensar a educação jurídica a partir da influência que exerce nos estudantes e na sociedade como um todo. Em ambos os casos, pelo menos em tese, a educação jurídica pode ser positiva, neutra ou negativa. Digo em tese, porque, na prática, é impossível que seja neutra. Para o aluno, não há nenhuma chance de que quatro horas por dia, durante cinco anos, não signifiquem nada. E o mesmo se pode dizer em relação à sociedade, tendo em vista o elevado número de cursos jurídicos em funcionamento e a importância das funções desempenhadas pelos bacharéis em Direito. Restam-nos, portanto, duas alternativas verdadeiras: a educação jurídica pode produzir efeitos positivos ou pode produzir negativos. Ou, em outras palavras, ela pode fazer bem ou pode fazer mal à saúde dos estudantes a quem se destina e da sociedade como um todo. Para a análise das consequências que a educação jurídica pode produzir, é preciso conhecer a base sobre a qual atua. Seria conveniente um diagnóstico profundo e completo, o que não poderemos realizar aqui.

Mas, convenhamos, os estudantes, no Brasil, salvo raríssimas exceções, deixam o ensino médio e ingressam na Universidade como verdadeiros autômatos, incapazes, completamente incapazes, de pensar por si. Surpreendem-se quando se lhes diz pela primeira vez que um problema jurídico pode não ter uma única solução correta. Revoltam-se quando se lhes propõem uma atividade acadêmica que não vise à acumulação de informações úteis, mas, apenas à crítica, à análise, à reflexão. E, sejamos francos, a sociedade em que vivemos tem problemas gravíssimos. Basta andar de olhos abertos para perceber, por exemplo, que há pessoas dormindo nas calçadas das faculdades onde o Direito é ensinado.

Nesse cenário, parece correto afirmar que a educação jurídica produzirá efeitos positivos quando proporcionar crescimento aos estudantes e quando contribuir para que a sociedade enfrente seus mais importantes desafios e, efeitos negativos, quando permitir que os estudantes concluam o curso do mesmo modo como começaram ou com hábitos e conceitos ainda piores e quando não produzir mudanças relevantes na sociedade em que está inserida ou colaborar para o agravamento de suas mazelas. Pois bem, havendo vários modos de enfrentar o assunto, tentarei oferecer um critério que possa ter alguma utilidade para analisar tanto o papel da educação jurídica brasileira, como um todo, quanto da educação oferecida em cada instituição de ensino, e, ainda, da educação proporcionada por um professor ou vivenciada por um aluno.

Sugiro que a educação jurídica produzirá efeitos positivos quando dirigir suas atenções para frente e para fora de si e efeitos negativos quando dirigir suas atenções para traz e para dentro de si. Ou, melhor, sugiro que tanto mais positivos serão os efeitos produzidos pela educação jurídica quanto mais atenta ela estiver às questões que se relacionam com o futuro e às questões que são importantes fora dos muros onde é praticada e tanto mais negativos quanto mais se ocupar do passado e das questões que são importantes apenas para sua economia interna.

A educação jurídica quando olha apenas para o passado, quando se ocupa tão somente do que já foi feito, das leis que já foram aprovadas, das correntes doutrinárias que já foram construídas, ou das tendências jurisprudenciais que já se consolidaram, produz consequências terrivelmente negativas. (
...)

 

Texto na sua íntegra publicado no blog do autor:  

https://magisteriojuridico.blogspot.com/2010/08/educacao-juridica-faz-mal-saude.html