José Ribas Vieira

José Ribas Vieira

Ao contrário da flexibilização adotada para o trabalho final (TCC) de curso na graduação de Direito institucionalizada pela Resolução CNE 09/04, a qualidade acadêmica das dissertações e teses nos nossos programas de pós-graduação deve estar comprometida com a defesa intransigente pela manutenção das monografias e sua defesa perante uma banca examinadora no nível dos cursos de bacharelado de direito. É necessário, em conseqüência, que adotemos como critério de ingresso, principalmente nos nossos mestrados, o candidato ter elaborado como TCC a monográfica com a devida comprovação da presença de banca examinadora. O bacharelado em Direito deve estar pautado em vincular-se com sua participação numa política de inserção na parte de Iniciação Científica. Quanto ao perfil acadêmico da mencionada política de iniciação cientifica a ser adotada numa graduação em direito, recomenda-se que ela esteja vocacionada como um instrumento de presença e divulgação da jurisprudência adotada nos nossos tribunais superiores. Assim, defendemos que as iniciativas de iniciação cientifica não só conscientizem os seus participantes para a compreensão do direito numa postura reflexiva como também esse comprometimento tem de estar voltado para a busca de uma capacidade argumentativa autônoma via estudo e interpretação crítica das decisões judiciais.

 

Os participantes da política de iniciação científica devem participar, ainda, dos grupos de pesquisa dos nossos programas de pós-graduação em Direito. Acresce a postura de reforçarmos a manutenção do formato de monografias e o adensamento da política de iniciação cientifica para um determinado perfil de graduação em direito, bem como a imperiosidade da presença das monitorias nesse nível de formação jurídica. Os programas de pós-graduação em direito poderiam contribuir para a maior irradiação dos professores com seus monitores na medida em que viabilizassem oficinas. As oficinas constituiriam um procedimento de agregar os professores de graduação em direito responsáveis pelas monitorias num espaço de discussão teórica e de conhecimento de práticas sob a coordenação de um professor de pós-graduação. Teríamos, assim, mais um instrumento para fortalecer e dar organicidade entre o bacharelado em direito e os respectivos mestrados e doutorados. Todo esse conjunto de esforços para a maior integração nos dois referidos níveis de formação jurídica e com o propósito de criar solidamente uma cultura de pesquisa completa-se com instrumentos como os da atividade complementar, incentivando os graduandos de direito a participarem, por exemplo, da defesa de dissertações ou teses.

 

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Os grupos de pesquisa, norteados por projetos de pesquisa ancorados numa rigorosa metodologia cientifica e de aplicação de técnicas de pesquisa, acreditamos, dariam concretude e viabilidade a essa visão vaga de “linhas de pesquisa” constantes na estrutura pedagógica e acadêmica dos nossos cursos desses últimos 20 anos. Cabe, ainda, destacar que a presença dos grupos de pesquisa abriria o caminho para maior identidade dos propósitos de nosso programa para uma produção do direito como crítica e voltada para um compromisso social de mudança, e não reduzido a uma mera preocupação disciplinar resultante das áreas de concentração. Poderíamos ter uma variada forma de constituição de grupos de pesquisa. Nesse sentido, há possibilidade de viabilizá-los de acordo com as respectivas linhas de pesquisa, por exemplo, para trabalhar com um aspecto mais de empiria. Assim, é possível termos um grupo de pesquisa voltado para compreender concretamente o acesso à justiça; outro formato que um grupo de pesquisa se direcionaria seria no estudo e acompanhamento da jurisprudência. No Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Gama Filho temos um exemplo importante, com publicação de uma obra em 2006 pela Editora Renovar, do “Laboratório Jurisprudencial” (Laj). O Laj, materializado pelo citado curso de pós-graduação, consubstancia a idéia de que, nesse espaço, na forma de experimento e de reflexão (laboratório), se estuda através de cortes como os da Hermenêutica, do Direito e da Moral e, por fim, do republicanismo para compreender os Direitos Fundamentais como os da intimidade e da vida privada, numa interpretação crítica, reflexiva e interdisciplinar no sentido de visualizar as decisões do Supremo Tribunal Federal em Direitos Fundamentais dispostos no artigo 5º, inciso X da Constituição Federal de 1988 em termos de direito à vida privada e direito à intimidade não numa visão meramente reprodutora.

 

Com esses exemplos da empiria e jurisprudencial é fácil constatar a potencialidade que um formato de um grupo de pesquisa pode gerar para um programa de pós-graduação em direito. Esses grupos deverão ser integrados por bolsistas de iniciação cientifica, mestrandos e doutorandos, de modo a gerar um fluxo contínuo de aprendizagem e de capilarização da formação jurídica de um determinado Curso de Direito em todos os seus níveis de conhecimento. Eles devem estar formalizados e integrados nos nossos programas de pós-graduação de natureza estrita, na modalidade de seminários de pesquisa, assegurando a elaboração de monografias da graduação, de dissertações e teses, bem como a publicação de obras como resultado visível dos citados grupos de pesquisa. É importante, com o intuito de fortalecer os grupos de pesquisa, como um meio de dar um caráter de formação jurídica mais no propósito de produção, que haja uma efetiva política de publicação de seus resultados, quer na modalidade impressa ou de meios virtuais. Agrega-se a essa postura afirmativa dos grupos de pesquisa, que se promova, periodicamente, um evento de um programa de pós-graduação de direito, para que cada um desses apresentem os seus resultados, sendo interessante a presença de avaliadores externos.

 

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A grade curricular de nossos programas de pós-graduação deve estar estruturada com tópicos objetivando proporcionar uma formação acadêmica flexível, permanente e de um equilíbrio entre a apreensão de um conteúdo teórico dos fundamentos clássicos do direito, quanto a uma perspectiva conjuntural. Listamos abaixo as modalidades de disciplinas e tópicos a nosso ver recomendáveis para um programa de pós-graduação em direito:

 

a) Leitura dos autores (de modo a dar segurança ao pós-graduando de delimitação de um preciso marco teórico nas dissertações e nas teses);

b) Estudo de temas;

c) Estudos interdisciplinares.

 

A preocupação com temas em uma perspectiva interdisciplinar possibilitará, naturalmente, que os nossos programas de pós-graduação em direito viabilizem a presença de outros campos de conhecimento. A titulo de exemplo, não é difícil supor como o universo ambiental pode merecer um tratamento mais amplo, quer numa linha temática ou interdisciplinar. É importante lembrar como Ulrich Beck denuncia que a denominada questão ambiental não deve (ou pode) ficar reduzida a uma mera questão técnica. Quanto à leitura de autores traria uma vantagem, além de fortalecer a investigação cientifica, que é a de superar essa cultura tão própria do direito: “a do ouvir dizer”, fora o fato de que ler um autor possa haver mais densidade teórica por parte dos mestrandos ou doutorandos.

 

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Por fim, aproveitando o aspecto positivo da competição entre os nossos cursos em razão dos critérios avaliativos e outros instrumentos adotados pela Capes (como é o caso recente da instituição do Prêmio Capes para a melhor tese em cada área de conhecimento), não esqueçamos que ela deve estar equilibrada não só pela prevalência da legitimidade acadêmica (mérito), mas também pela nossa integração nas diversas modalidades de redes a serem materializadas entre nós. Não pode ser esquecido que os nossos programas de pós-graduação em direito, por esse perfil assumido por nós de produção, devem traduzir, também, um compromisso com a mudança social. É louvável, dessa forma, a explicitação formulada pela Capes, no instrumento data capes, de incluir o item de inserção social. Os nossos cursos de mestrado e doutorado devem apresentar, pelo instrumento natural da avaliação, como indutor, certa repercussão social. A esse critério avaliativo de certo comprometimento dos nossos cursos, a Capes recomenda, também, a concepção de solidariedade, isto é, a capacidade de nossos cursos darem apoio a outros programas de pós-graduação em regiões do país ainda carentes dessa política de formação profissional e acadêmica.

 

(Excertos do artigo: VIEIRA, José Ribas. Instrumentos e experiências acadêmicas: a busca do perfil de pesquisa nos programas de pós-graduação em Direito. Revista da Faculdade de Direito de Campos, Ano VII, Nº 9, dezembro de 2006, p. 103-117.

https://www.fdc.br/Arquivos/Mestrado/Revistas/Revista09/Artigos/JoseRibas.pdf